COMENTÁRIO NUMA QUESTÃO DE CONCURSO:
1. (CESPE/UnB – SAEB PGE/BA – Aplicação: 2014 -
Cargo: Procurador do Estado da Bahia) De acordo com a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), a administração pública está
obrigada a nomear candidato aprovado em concurso público dentro do número de
vagas previsto no edital do certame, ressalvadas situações excepcionais dotadas
das características de superveniência, imprevisibilidade e necessidade.
Comentário: CORRETO.
Boa tarde amigos,
Para responder integralmente o item, faremos uma análise do
RE 598.099/MS, de Relatoria: Min. Gilmar Mendes, Informativo: 635.
A questão central a ser discutida no referido Recurso
Extraordinário é se o candidato aprovado em concurso público dentro do número
de vagas possui direito subjetivo,
ou apenas expectativa de direito, à nomeação.
Na Sessão Plenária de 13/12/1963, foi aprovada pelo STF a
Súmula n. 15, cuja redação é a seguinte: “Dentro prazo de validade do
concurso, o candidato aprovado tem o direito à nomeação, quando o cargo for
preenchido sem observância da classificação”. Dos precedentes que originaram
essa Súmula (ACI-embargos 7387, Rel. Min. Orosimbo Nonato, DJ 5.10.1954; RMS
8724, Rel. Min. Cândido Motta Filho, DJ 8.9.1961; RMS 8578, Rel. Min. Pedro
Chaves, DJ 12.4.1962) extrai-se que a aprovação em concurso dentro das vagas
não confere, por si só, direito à nomeação no cargo.
Naquela época, o
candidato só teria direito subjetivo (e não apenas mera expectativa) quando
houvesse preterição na ordem de classificação. A partir daí, os precedentes
acerca deste tema caminhavam no sentido de que a “aprovação em concurso público
não gera, em princípio, direito à nomeação, constituindo-se mera expectativa de
direito.
Entretanto, numa evolução de pensamento
(sempre levando em consideração a nova ordem constitucional), no julgamento da
SS-AgR 4196, Rel. Min. Cezar Peluso, o Plenário do STF, por decisão unânime,
entendeu que não causa grave lesão à ordem pública a decisão judicial
que determina a observância da ordem classificatória em concurso público, a fim
de evitar preterição de concursados pela contratação
de temporários, quando comprovada a necessidade do serviço.
Nesse sentido
também, o STF reconhecia apenas duas hipóteses de direito subjetivo à nomeação:
a) no caso de preterição da ordem de classificação e b) no caso de
terceirização da vaga (ou seja, contratação de temporários ou nomeação de ordem
meramente precária).
No RE 227.480, de relatoria da Min. Carmen Lúcia,
divergindo da antiga jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a 1ª Turma do
STF teve a oportunidade de afirmar que candidatos aprovados em concurso público
têm direito subjetivo à nomeação para
posse que vier a ser dada nos cargos
vagos existentes ou nos que vierem a
existir no prazo de validade do concurso.
Em casos como estes, a recusa da
Administração Pública em prover cargos vagos quando existentes candidatos
aprovados em concurso público deve ser motivada, e esta motivação é
suscetível de apreciação pelo Poder Judiciário!
No referido
julgamento, a Min. Carmen Lúcia sustentou que “há o direito subjetivo à
nomeação, salvo se sobrevier interesse público que determine que, por uma nova
circunstância, o que acontecer na hora da convocação ponha abaixo o edital”. Ou
seja, não há que se falar em aplicação do instituto do DIREITO ADQUIRIDO, mas
sim de DIREITO LÍQUIDO E CERTO, eis
que o referido direito subjetivo pode ser afrontado por uma nova circunstância
da Administração que a impeça de nomear, não havendo, por conseguinte, ilícito
por parte da administração.
Outro ponto a se
destacar é que “nos termos constitucionalmente postos, não inibe a abertura de
novo concurso a existência de candidatos classificados em evento ocorrido
antes. O que não se permite, no entanto, no sistema vigente, é que, durante o
prazo de validade do primeiro, os candidatos classificados para os cargos na
seleção anterior sejam preteridos por aprovados em novo certame”. Dessa
maneira, pode a administração realizar novo concurso, desde que se observe a
nomeação dos candidatos aprovados em concurso anterior realizado.
Nessa linha de
raciocínio, que segue o caminho dessa nítida evolução da jurisprudência, o STF
entende que o dever de boa-fé da
Administração Pública exige o respeito incondicional às regras do
edital, inclusive quanto à previsão das
vagas do concurso público. Para o STF, decorre de um necessário e
incondicional respeito à segurança jurídica como princípio do Estado de
Direito.
Para o referido
Tribunal “quando a Administração Pública torna público um edital de concurso,
convocando todos os cidadãos a participarem de seleção para o preenchimento de
determinadas vagas no serviço público, ela impreterivelmente gera uma
expectativa quanto ao seu comportamento segundo as regras previstas nesse
edital”.
Fazendo uma
interpretação do Texto Constitucional, o art. 37, inciso IV, garante prioridade
aos candidatos aprovados em concurso, nos seguintes termos: “(...) durante o
prazo improrrogável previsto no edital de convocação, aquele aprovado em
concurso público de provas ou de provas e títulos será convocado com prioridade
sobre novos concursados para assumir cargo ou emprego, na carreira”. Com isso,
é possível concluir que, dentro do prazo de validade do concurso, a Administração
poderá escolher o momento no qual se realizará a nomeação, mas não poderá dispor sobre a própria nomeação, a qual, de
acordo com o edital, passa a constituir um direito do concursando aprovado e,
dessa forma, um dever imposto ao poder
público.
Resumindo, esse
direito à nomeação surge, quando preenchidos os seguintes requisitos fáticos e
jurídicos:
a) previsão em
edital de número específico de vagas a serem preenchidas pelos candidatos
aprovados no concurso público;
b) realização do
certame conforme as regras do edital;
c) homologação do
concurso e proclamação dos aprovados dentro do número de vagas previsto no
edital, em ordem de classificação, por ato inequívoco e público da autoridade
administrativa competente.
Tal direito à
nomeação decorre do princípio da acessibilidade aos cargos públicos (ROCHA,
Cármen Lúcia Antunes. Princípios Constitucionais dos Servidores Públicos. São
Paulo: Saraiva; 1999, p. 143).
A existência de
um direito à nomeação, nesse sentido, limita a discricionariedade do Poder
Público quanto à realização e gestão dos concursos públicos.
Não obstante,
quando se diz que a Administração Pública tem a obrigação de nomear os
aprovados dentro do número de vagas previsto no edital, deve-se levar em
consideração a possibilidade de situações EXCEPCIONALÍSSIMAS
que justifiquem soluções diferenciadas, devidamente motivadas de acordo com o
interesse público.
Como já
demonstrado, não se pode ignorar que determinadas situações excepcionais podem
exigir a recusa da Administração Pública de nomear novos servidores.
Para justificar o
EXCEPCIONALÍSSIMO não cumprimento do
dever de nomeação por parte da
Administração Pública, uma vez já preenchidas as condições acima delineadas, é
necessário que a situação justificadora seja dotada das seguintes características:
a) Superveniência: os eventuais fatos
ensejadores de uma situação excepcional devem ser necessariamente posteriores à
publicação do edital do certame público. Pressupõe-se com isso que, ao tempo da
publicação do edital, a Administração Pública conhece suficientemente a
realidade fática e jurídica que lhe permite oferecer publicamente as vagas para
preenchimento via concurso. b)
Imprevisibilidade: a situação deve ser determinada por circunstâncias
extraordinárias, imprevisíveis à época da publicação do edital. Situações
corriqueiras ou mudanças normais das circunstâncias sociais, econômicas e
políticas não podem servir de justificativa para que a Administração Pública
descumpra o dever de nomeação dos aprovados no concurso público conforme as regras
do edital.
c) Gravidade: os acontecimentos
extraordinários e imprevisíveis devem ser extremamente graves, implicando
onerosidade excessiva, dificuldade ou mesmo impossibilidade de cumprimento
efetivo das regras do edital. Crises econômicas de grandes proporções, guerras,
fenômenos naturais que causem calamidade pública ou comoção interna podem
justificar a atuação excepcional por parte da Administração Pública.
d) Necessidade: a solução drástica e
excepcional de não cumprimento do dever de nomeação deve ser extremamente
necessária. Isso quer dizer que a Administração somente pode adotar tal medida
quando absolutamente não existirem outros meios menos gravosos para a lidar com
a situação excepcional e imprevisível
Ressalte-se que a recusa deve ser devidamente MOTIVADA,
especialmente demonstrando-se os requisitos acima delineados.
Uma ressalva importantíssima que pode cair na sua prova: “o
dever da Administração e, em consequência, o direito dos aprovados na nomeação,
não se estende a todas as vagas existentes,
nem sequer àquelas surgidas
posteriormente, mas apenas àquelas expressamente previstas no edital de
concurso”.
Em síntese, a
Administração Pública está vinculada às normas do edital, ficando inclusive
obrigada a preencher as vagas previstas para o certame dentro do prazo de
validade do concurso, ressalvadas as situações excepcionais dotadas das
características de superveniência, imprevisibilidade, gravidade e necessidade.
Dessa maneira, o
item está integralmente CORRETO.
Um comentário:
Ótima explicação, professor!
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