Neste contexto, surge o instituto
da terceirização das relações de trabalho, que vem com a intenção para que a atenção
negocial de determinada empresa seja apenas voltada para a sua atividade
principal, deixando a cargo da empresa prestadora de serviços (empresa
terceirizada) as atividades não essenciais.
Com isso, a razão para a
existência de empresas terceirizadas é para que a atividade-meio seja realizada
por empresa contratada.
O texto principal aprovado pela
Câmara amplia a terceirização para todos os setores, inclusive nas vagas
relacionadas à atividade-fim das empresas contratantes. Atualmente, só é
permitida a terceirização em atividades-meio, como limpeza e segurança.
A terceirização da forma como
está hoje apresenta alguns quadros preocupantes:
- entre 2010 e 2013, nas 10
maiores operações de resgate de trabalhadores em situação análoga à escravidão,
quase 3.000 dos 3.553 casos envolviam terceirizados;
- No caso de óbitos durante o
serviço no setor elétrico, em 2013 perderam a vida 61 terceirizados, contra 18
empregados diretos;
- Na construção de edifícios, foram
75 mortes de terceirizados em um total de 135 mortes;
- Nas obras de acabamento, os
terceirizados foram 18 do total de 20 óbitos, nas de terraplanagem, 18 entre 19
casos e nos serviços especializados, 30 dos 34 casos detectados.
Com esse quadro apresentado,
mesmo estando a terceirização permitida apenas para a atividade-meio, imaginem
como será a condição do trabalhador se o quadro de terceirização for ampliado
para toda e qualquer atividade do setor privado?
Sem dúvida, caminhamos para uma
subversão do próprio instituto da terceirização e também para um quadro de
retrocesso das relações de trabalho.
A ampliação do instituto viola
frontalmente os princípios da proteção ao trabalhador, da norma mais favorável,
da condição mais benéfica, do tratamento isonômico que deve haver entre
trabalhadores que prestam serviço a uma mesma empresa, da dignidade do
trabalhador, entre tantos outros princípios de ordem constitucional.
Ao eliminar de uma vez tais
princípios, temos a mercantilização do trabalhador.
Por que faço tal afirmação?
O direito do trabalho apenas após
anos de conquistas sociais tem se firmado e sido reconhecido como autônomo do
direito civil, isto é, não se deve tratar o trabalhador sem um rol de condições
mínimas de jornada, trabalho e especialmente segurança do trabalho.
O instituto da terceirização tem
por fundo central o pagamento cada vez mais baixo de salário ao trabalhador,
isso porque ganha a licitação (instituto que deverá ser utilizado pelas
empresas privadas para contratarem prestadores de serviço da atividade-meio ou
atividade-fim) aquela empresa prestadora que fizer o menor preço. Por
consequência, o salário do trabalhador tende a ser reduzido, assim como suas
verbas rescisórias tendem a ser inadimplidas.
Mas aí alguém vai me dizer que “mas
as empresas tomadoras do serviço serão responsabilizadas, certo?”, resposta:
certo, mas com ressalvas, e o problema está exatamente nessas ressalvas.
Para o projeto de Lei n.
4.330/2004, a responsabilidade da empresa que se beneficiou diretamente do
esforço do trabalho será meramente subsidiária.
Em minha opinião, a
responsabilidade da empresa tomadora deveria ser solidária ou direta, com
direito à empresa tomadora ajuizar ação regressiva contra a empresa
inadimplente.
A responsabilidade subsidiária
ocorre somente pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas da prestadora de
serviços. Nesse caso, o responsável subsidiário (o tomador de serviços)
responderá pelas obrigações, desde que tenha participado da relação processual
e já tenha havido o trânsito em julgado da decisão.
Qual a consequência fática disto?
De fato, conforme se verifica da
nossa experiência na área trabalhista, a execução do responsável subsidiário
demora a ocorrer, e isso facilita a inadimplência dos tomadores de serviço.
Em poucas palavras, a empresa que
se beneficiou diretamente da prestação de serviços consegue um prazo ainda
maior para não ser responsabilizada financeiramente.
Assim, o trabalhador prejudicado e
necessitado de receber o quanto antes suas verbas trabalhistas (registre-se
aqui a necessidade de se alimentar) vai ter de esperar um prazo ainda maior.
Em resumo, tendo como valor a
proteção à dignidade do trabalhador e o valor social dos contratos de trabalho,
bem assim de modo a evitar a mercantilização do trabalhador, o PL 4330/2004
deverá sofrer várias modificações para que não seja um retrocesso muito grande
para as relações de trabalho.
*o autor Kléber Vinicius é Defensor Público Federal, atua em ofício trabalhista do DF, professor de Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. Membro da Câmara de Coordenação e Revisão Trabalhista da DPU.
*o autor Kléber Vinicius é Defensor Público Federal, atua em ofício trabalhista do DF, professor de Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. Membro da Câmara de Coordenação e Revisão Trabalhista da DPU.
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